Automação e conveniência de compra são apostas do setor supermercadista

 Automação e conveniência de compra são apostas do setor supermercadista

A rede Enxuto, do interior de São Paulo, testa inovações com o ‘drone terrestre’ de entrega (esq.) e o carrinho de compras inteligente

A pandemia obrigou o setor supermercadista a olhar para a tecnologia com outros olhos – inclusive, o de sobrevivência, segundo Artur Motta, pesquisador do Centro de Excelência em Varejo da FGV EAESP. Nesse contexto, muitas novidades surgiram e contribuíram para melhorar processos internos e aumentar a conveniência de compra para o consumidor. 

A seguir, Motta comenta algumas tendências para o segmento que foram apresentadas durante a APAS Show 2022, evento realizado pela Associação Paulista de Supermercados.

Carrinho inteligente – Utilizando conceitos dos carros autônomos, o carrinho inteligente é equipado com tela touch screen, leitor de código de barras e máquina de cartão, permitindo ao consumidor fazer todo o processo de checkout e pagamento no próprio carrinho.

São cinco câmeras instaladas e uma balança móvel – ferramentas que têm papel fundamental no monitoramento dos produtos que são colocados e retirados de dentro do carrinho, além de auxiliar na segurança e contribuir com a prevenção de perdas.

Disponíveis em uma das lojas da rede Enxuto, em Campinas, no interior de São Paulo, os oito carrinhos equivalem a 2% da frota disponível para os consumidores. O objetivo é subir a porcentagem para 10% da frota nas lojas até o final do ano. O custo para produção de cada unidade é de R$ 120 mil.

“Até pouco tempo, havia muita resistência ao self checkout mas, hoje, ele já vem muito forte. Ainda há muito a se provar, mas não é loucura dizer que o carrinho inteligente é o self checkout de amanhã”, diz Motta.

Drone terrestre – Também em fase de testes pela rede Enxuto, em Paulínia, no interior de São Paulo, um carrinho robô que funciona como uma espécie de drone terrestre é quem realiza as entregas dentro de um condomínio de 700 casas. 

Com capacidade para carregar até 35 quilos, o carrinho circula pelo condômino a uma velocidade de até seis quilômetros por hora e se guia por sensores que reconhecem o caminho e os endereços por meio de um mapeamento prévio do condomínio.

O carrinho é monitorado em tempo real pela empresa MyView e os sensores são programados para parar o carrinho em caso de obstáculos, inclusive, aqueles com movimento, como animais, pessoas e carros, por exemplo.

A ferramenta tem como local de origem a loja Enxuto Drive, que fica dentro do próprio condomínio e que aceita pedidos por whatsapp. Um funcionário da unidade é o responsável por separar, embalar e carregar o carrinho.

O cliente é avisado previamente sobre o tempo de chegada via WhatsApp e os produtos gelados e congelados serão acondicionados em pequenas caixas de isopor dentro do carrinho.

Inicialmente, a porta do carrinho pode ser aberta através de uma chave que é encaminhada junto ao robô, mas a expectativa é que com a evolução do projeto, o cliente possa ter acesso à mercadoria por meio de uma senha que receberá no ato da compra.

Segundo Motta, esse tipo de iniciativa promove uma das grandes questões atuais do varejo – a entrega last mile.

“O last mile é a grande questão atual do varejo. Em comunidades americanas já temos essa realidade e, embora seja difícil pensar nisso nas ruas de São Paulo, é totalmente possível dentro desse cenário de prédios, onde estão centenas de famílias reunidas”, diz.

Loja autônoma – A exemplo da grande referência mundial que é a Amazon Go, as lojas autônomas levantaram dúvidas a princípio, mas encontraram oportunidades com o avanço da tecnologia e os efeitos da pandemia.

Mundo afora elas já eram bastante conhecidas, sobretudo nos Estados Unidos, com a Amazon GO, na China, com a Bingo Box, Carrefour Flash (Europa) e Hema Supermarket (Alibaba). No Brasil, o cenário para o desenvolvimento desses modelos de negócio ganhou tração com a Zaitt.

Motta defende a ideia de que tudo que passa pela automatização acumula uma série de vantagens, especialmente a redução de custos. A grande pergunta sobre esse modelo, segundo o especialista, está ligada à prevenção de perdas, embora os gestores assegurem que não seja algo tão significativo.

“Acredito que houve uma mudança de contexto e que o consumidor se acostumou a ser mais independente. Para muitos lugares, esse modelo é muito vantajoso”.

Hiperconveniência – Com aplicativos para tudo, os consumidores estão cada vez mais conectados e os varejistas, por sua vez, numa busca incessante por fazer parte dessa rotina toda permeada por tecnologia.

Entretanto, esse cenário da sociedade atual muitas vezes nos direciona a pensar que conveniência está ligada a agilidade, quando, na verdade, a cultura da hiperconveniência representa a realidade de uma geração que preza por mais momentos de lazer e relaxamento – e isso, nem sempre significa aderir à aplicativos, como o Rappi e Ifood e tantos outros.

É seguro dizer que há quem prefira receber uma encomenda de vinhos no conforto de seu lar, sem ter tido o trabalho de carregar sacolas pesadas com garrafas de vidro. No entanto, também não é loucura dizer que há quem prefira gastar horas dentro de uma loja à procura do rótulo ideal para um jantar.

“Esse conceito de hiperconveniência não é necessariamente a mesma coisa para todo mundo. Mas cabe bem em qualquer negócio, basta descobrir qual é o seu”, diz Motta.

Por essa razão, cabe ao varejista entender qual é a hiperconveniência que cada negócio irá vender, já que isso se manifesta a partir da necessidade ou do gosto do consumidor – que dirá quanto ele está disposto a pagar por tal comodidade.

Lojas como pontos de convivência – O longo período em isolamento social e a força da conveniência digital mudaram os hábitos e as expectativas da clientela. Os consumidores estão cada vez mais habituados a achar facilmente o que procuram, com informações detalhadas, pagar facilmente suas compras. A expectativa é reduzir ao mínimo eventuais atritos nestes momentos.

Por essa razão, o varejo precisa responder com uma nova proposta de atuação – reconfigurando seu ponto de venda e transformando-o num ponto de encontro, segundo Motta.

“A loja começa a exercer um papel mais amplo, e não se restringe à venda de produtos baseados na racionalidade”. 

Negócios colaborativos – Para Motta, o relacionamento entre indústria e varejo passa por uma revolução e pode ser considerado a bola da vez. Trabalhando como verdadeiros aliados, as duas pontas podem maximizar os resultados do negócio.

Munidos de tantas informações relevantes, indústria e varejo podem atuar em conjunto para identificar mudanças do comportamento de consumo. Neste sentido, essa colaboração e análise de dados podem fazer com que o varejista antecipe as necessidades dos clientes.

Dados bem analisados podem surgir a partir da elaboração de um Joint Business Plan, explica Motta. O Joint Business Plan (JBP) é um plano de negócios, desenvolvido conjuntamente, pelo qual são identificadas e estruturadas as oportunidades por meio de metas e plano de ação com foco no longo prazo entre indústria e varejo, visando alcançar resultados positivos para todas as partes, com foco no consumidor final.

Ao unir a capacidade de captação de inovação da indústria com a capilaridade das informações de comportamento do varejo, é possível expandir as bases desta relação já existente para além do setor de compras, envolvendo as demais áreas estratégicas das empresas.