Debate aborda medidas sustentáveis para um Brasil mais produtivo e eficiente
Crise energética, escassez hídrica e relevâncias da economia circular e da logística reversa reiteram a necessidade de ações e reformas urgentes e cruciais para o País
A cidade de São Paulo enfrenta mais problemas com a distribuição de energia elétrica, parcialmente interrompida na região — e os prejuízos do Comércio e dos Serviços seguem se acumulando. De acordo com cálculos da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), as perdas de faturamento bruto dos setores já somaram, pelo menos, R$ 1,82 bilhão.
Os prejuízos causados pelo apagão culminaram com os temas discutidos pelo Conselho de Sustentabilidade da Federação na reunião de outubro — a crise energética e a escassez hídrica, além do protocolo global de circularidade para empresas, incluindo Logística Reversa (LR). Os especialistas em energia, as empresas e os membros do conselho discutiram a atual situação do fornecimento elétrico no Brasil, ressaltando principalmente o impacto da seca sobre as regiões Norte, Centro-Oeste e Sudeste, além das medidas favoráveis e dos possíveis desafios para os próximos meses.
Um dos convidados de destaque foi Luiz Eduardo Barata, ex-presidente do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) e atual presidente da Frente Nacional de Consumidores de Energia. O especialista trouxe à tona dois pontos principais para discussão: o possível retorno do horário de verão e a situação do suprimento de energia diante de condições climáticas extremas. “Embora o Brasil enfrente uma seca severa, não há um risco imediato de desabastecimento”, destacou.
Barata mencionou que a matriz energética nacional é predominantemente limpa, composta por hidrelétricas, eólicas e solares, mas ressaltou que as hidrelétricas, responsáveis por grande parte da geração de energia, sofrem diretamente com a escassez de água nos reservatórios. “Mesmo assim, o Brasil conseguiu iniciar o período seco com níveis ‘razoáveis’ de armazenamento de água, graças a condições climáticas mais favoráveis em 2022 e 2023”, completou.
Segundo o especialista, o maior problema é o custo da operação. A seca obriga o País a recorrer a fontes alternativas de energia, como as térmicas, que são mais caras e poluentes. Isso já resultou na adoção da bandeira vermelha nível 2, encarecendo a conta de energia para os consumidores. “Não temos risco de desabastecimento nos curto e médio prazos, mas um risco real de aumentos consideráveis na conta de energia”, afirmou.
Horário de verão e benefícios
Suspenso no Brasil em 2019, o horário de verão foi apontado como uma das medidas para gerar economia, e a conjuntura energética atual justifica a sua reavaliação. Para a FecomercioSP, o retorno da medida significaria redução de custos e aumento de vendas no varejo e nos serviços, mas é preciso tempo hábil para os negócios se prepararem, especialmente no Turismo.
De acordo com a avaliação da Federação, a volta do horário de verão traria, de fato, impactos positivos para os setores do Comércio, dos Serviços e do Turismo, já que possibilitaria a ampliação do período de funcionamento dos estabelecimentos para atender à circulação maior de consumidores nas ruas, bem como permitiria uma redução de custos no consumo de eletricidade.
Já o ex-presidente do ONS reforçou que, com o aumento da geração de energia solar, o deslocamento de carga para o fim da tarde, quando o sol ainda está presente, pode reduzir a necessidade de uso das termoelétricas, o que diminuiria tanto os custos quanto as emissões de Gases de Efeito Estufa (GEEs). “Estudos do ONS apontam que o retorno do horário de verão poderia gerar uma economia de aproximadamente R$ 400 milhões neste ano. Além disso, a adoção da prática nos próximos anos poderia evitar a necessidade de contratação de 2 gigawatts de potência adicional, gerando uma economia de até R$ 1,8 bilhão”, disse Barata.
A discussão com os participantes da reunião foi marcada por diferentes pontos de vista, inclusive daqueles que questionam os benefícios em razão do desconforto causado à população, como o deslocamento de horários e os reflexos na saúde. No entanto, o presidente do Conselho de Sustentabilidade da FecomercioSP, José Goldemberg, enfatizou a importância da medida. “Diante da crise climática e da necessidade de reduzir custos e riscos operacional e de segurança de abastecimento, especialmente nos horários de pico, o horário de verão pode ser uma solução decisiva e eficaz nos curto e médio prazos”, defendeu.
Efeitos econômicos e ambientais
Durante a reunião, Barata também realçou a necessidade de conscientização da população para reduzir o consumo energético. Ele destacou que mecanismos de resposta da demanda, amplamente usados na Europa e nos Estados Unidos, poderiam ser adotados no Brasil para reduzir as consequências da crise energética. Esses mecanismos permitem que os consumidores ajustem voluntariamente os próprios hábitos de consumo, sem comprometer o conforto ou a produção, resultando em economia para todos.
Outro ponto discutido foi a escassez hídrica. Apesar de o Brasil não sofrer com uma crise imediata de desabastecimento, Goldemberg salientou que as gestões de energia e água devem ser aprimoradas. “Os reservatórios, ainda que não estejam em níveis críticos, não se encontram em situação extremamente confortável também. O senhor pode nos esclarecer quais foram as ações de melhorias nos programas de utilização e otimização da água?”, questionou ao ex-presidente do ONS.
Barata respondeu que o Brasil usa a mesma cadeia dos últimos anos. “Essa é uma das necessidades que o ONS tem hoje: a melhoria do mecanismo de formação de preço e, consequentemente, do planejamento de uso do sistema de abastecimento como um todo.” O especialista ainda mencionou que o setor energético precisa ser preparado para lidar com eventos climáticos extremos, que se tornarão cada vez mais frequentes: “para isso, precisamos de um planejamento de longo prazo, incluindo a retomada de investimentos em hidrelétricas reversíveis, que podem ser uma solução para garantir o abastecimento energético em tempos de seca.”
Frente à continuidade dessa situação e às previsões climáticas incertas, os debates sobre as medidas, a Reforma Administrativa e a modernização estatal, assim como a adoção de novas políticas do tipo, ganham relevância para promover mais eficiência, enquanto o Brasil busca equilibrar segurança energética, sustentabilidade e custo para os consumidores. “Nós, da FecomercioSP, somos muito ativos nessas questões e promovemos, constantemente, orientações e campanhas de esclarecimento aos diversos setores. O melhor que podemos fazer diante das dificuldades que surgirão é recomendar a racionalização do uso de energia nos próximos meses”, concluiu Goldemberg. A reforma do setor de energia, por sua vez, deve partir do governo, pois requer uma revisão completa, muito bem planejada e articulada, e a favor do coletivo, sem favorecer grupos específicos.
Painel de economia circular
Após a reunião, foi divulgado o protocolo mundial de circularidade para empresas, em elaboração pelo Conselho Empresarial Mundial para o Desenvolvimento Sustentável e pela One Planet Network, seguido por apresentações da Leroy Merlin e da Telhanorte a respeito de um produto de economia circular, uma areia reciclada obtida a partir de resíduos cerâmicos das lojas.